A armadilha tem preço: o foco da bola mascarada
Olhar o mundo. Mas qual é foco? Perceber a totalidade é impossível. Afirmar que tudo é uma confusão de fragmentos, mal coordenados, apaga a alegria. Evitar o brilho das cores, negar a linguagem dos objetos, disfarçar a solidão das estrelas tardias, nada disso traz ânimo para seguir adiante. Continuo apostando no entrelaçamento, nas costuras dos atos. Não que elas sejam visíveis e materiais. Também não estão fora da história, são movidas pela sensibilidade. Descartes está noutra dimensão, seu discurso do método desfia as verdades dos seus contemporâneos.
Há lugares e tempos. Não são poucos. A reflexão exige que o olhar não se perca, no foco das novidades, e abomine as permanências. O eterno retorno não é uma maluquice. A ruptura definitiva é uma megalomania. Tudo não é o mesmo, nem o seu oposto. Piso na chão, sento na cadeira, faço carinho, comunico-me. Ouço murmúrios dos livros, no quarto da biblioteca. Conversas sábias. Lá estão Montaigne, Freud, Carlos Fuentes, Guimarães Rosa e tantos outros mandado energia para vida. É o reino da gratuidade sublime.
O movimento está fora do corpo, balança páginas dos jornais, manda-me para outros espaços. Não faltam violências, drogas, disputas, hipocrisias. Muita gente se anuncia como dona de nossos destinos. Pouco ligo. Sei que a sociedade é competitiva e não me engano com o riso fácil das imagens. O importante é o foco. O que se repete? O que se mascara? O que distrai a ordem, sem festejar a transgressão? Minha leitura aproxima-se das palavras, não para ser servo, mas para desfazer as hierarquias.
A suspeita é uma trilha. Trabalhosa e estreita, porém os sinais estão presentes, basta decifrar as relações de poder. Quem é o vencedor? Quem elege o discurso do bem? Quem se diz salvador de todos os pecados? Quem fabrica provocações sem estimular solidariedade? Perguntas que fustigam interpretações. Desconfianças que assanham autonomias. Raciocínios que visitam as armadilhas e mostram a nudez escondida. Tudo tem um preço, me ensinam os senhores do capital. Nada assustador, pois no século XIX, Marx já desmontava as ilusões do progresso, onde se aluga a vontade.
Muita fala para pouco assunto? Talvez. São as amarras do ofício. Quando lembro que o mercado da bola se perfuma com o tilintar das moedas, não se trata de um exercício sedutor de retórica. Voltam a lógica da suspeita, as investigações da curiosidade nas colunas da imprensa. Surgem acusações que vinham se arrastando desde os tempos da Copa na África do Sul.Os dados remetem a corrupções fortalecidas pelo silêncio ardiloso dos negócios. O público quer rasgar a venda das polêmicas. O poderoso Ricardo Teixeira firma-se na mudez.
O foco é imenso. Os culpados se revelam inocentes, diante do fato propalado de que há dinheiro rolando para a escolha das sedes dos mundiais de futebol. A Fifa promete aprofundar o caso, diante do escândalos estampados por jornais ingleses. Ninguém é ingênuo. Há interesses expostos nas vitrines das trocas nada inocentes. Quando o cinismo transforma-se em ator principal, feche o nariz e fuja para o quintal. Purique o ambiente, com urgência.
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