A competição vigia o cotidiano e o próximo
Competir é palavra de ordem na sociedade atual. Ela nos acompanha, desde o despertar. As cidades metropolitanas são núcleos centrais das disputas pessoais. A desconfiança é generalizada. Poucos conseguem acenar com um afeto sincero. Os grupos de amigos são guetos. A presença da propaganda sugere que é preciso estar atento. A negligência é um pecado capital. A punição é múltipla, significa perdas. Acordar tarde pode levá-lo ao desemprego. Escolher uma roupa destoante pode gerar desconforto nos ambientes. Você é comparado ao outro. Não faltam espelhos ou sinais de diferença. A vitória final traz sucesso e lugar privilegiado na hierarquia. Ouve-se isso, praticamente, todos os dias.
É cenário desgastante. Não é correto torná-lo absoluto. Nem todos entram na roda da boa aparência, nem prestigiam a corrida da aceitação coletiva. Há rupturas e insatisfações. A modernidade destruiu preconceitos e deu outro espaço ao que , antes, era profano. O mundo da Igreja Católica desmoronou, em algumas das suas bases, depois da Reforma, das críticas iluministas, das revoluções contemporâneas. Manteve, no entanto, poder de articulação com a política e suas crenças não desapareceram. A diversidade social transformou culturas. Novas práticas exigiram que as coisas terrenas usufruíssem da rapidez na sua busca por acumulação de bens materiais. A transcendência sofreu abalos indiscutíveis.
O capitalismo não vive sem a dissonância. Mudanças, surpresas, desequilíbrios lembram o personagem de Kafka no seu livro Metamorfose. Muitos esquecem que os hábitos demoram em fixarem suas imagens, daí os conflitos e as discórdias intelectuais. Não visualize um cotidiano homogêneo, porque existem contradições e a competição encontra quem lhe responda com a solidariedade. O olhar da maioria elege a mesmice e não se esforça para firmar a crítica, porém os descontentamentos reinventam atos e criam outras palavras de ordem. O sossego é uma distração vadia.
Há retornos, passados que se colam no presente. Cenas, em sofisticadas capitais tecnológicas, que recordam situações medievais. No mundo das ideias, consolidam-se princípios que pareciam mortos. Os jornais noticiam comportamentos estranhos, para quem usa computador e não suportar ler mensagens longas. O Google é o dicionário das abrangências inusitadas. Fascina. Desafia. Nem por isso, os terrorismos deixam de retomar fundamentalismos e os neonazistas de divulgar suas vinganças em extensos manifestos. A confusão não é gratuita. A loucura está para além do que Freud cogitou e mundo gira sem uma lógica serena.
A competição balança-se no trapézio do bem e o mal. Não temos certezas definidas que aquietem os vazios e movam esperanças. O bem e o mal são relativos, entrelaçam-se com os choques do sagrado com o profano. Os mais espertos negociam a moral, a religião, a virtude. As aparências cegam e garantem rapidez no mercado. Não espere que a sociedade se canse, pois há imaginários que esticam a aldeia global. A marca da competição é poderosa. Joga, ilude, desfia. Ela está naturalizada, no coração e na mente de muitos. Quem não observa o vaivém da história descobre futuros limpos e destruidores dos laços com o vivido. Há quem aposte na submissão do tempo ao império dos desejos.
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Antonio, arauto da solideriedade, o eco das tuas palavras funciona nos
silêncios dos atentos. Isso equivale dizer que não pregas no deserto.
“… e há aqueles que lutam a vida inteira, esses são os imprescindíveis”
Até breve.
Valério
Se houvesse mais solidariedade as coisas estariam equilibrados ou menos repletas de violência.
abs
antonio paulo
A violência não usa discursos… usa a prática, esta mesma prática que falta aos pobres garotos intelectuais, com sua voz fanha e suas linguagens hieroglíficas.
Devemos aprender com a violência… ela age.
Júlio
Com certeza, a violência se faz presente e age. Mas é bom pensar noutras saídas. Já pensou se todos optam pela agressividade?
abs
antonio paulo
Há a violência dos discursos. Os modus operandi utilizados pelos praticantes da violência são variados, mas a violência, esta forma agressiva, que sempre vem acompanhada pela exaustão das situações insuportáveis, pode promover mudanças realmente significativas.
Não podemos esquecer de Gandhi. Seu satiagraha é a prova mais eloquente de uso da violência que abate os ouvidos, balança os cérebros e mobiliza opiniões.
Quem dera fôssemos tão violentos quanto gandhi.
Júlio
As dimensões do agir são múltiplas.Muitas vezes, a violência traz modificações, muda situações. Outras vezes, apenas, matam ou intimidam liberdades promissoras. Exemplos existem e muitos.
abs
antonio paulo