O pântano da dor desmancha
Ninguém conhece uma história sem sofrimentos. A linearidade é apenas uma ficção tola, pois o coração não bate sempre no mesmo ritmo. Podemos imaginar paraísos, mas não há como negar os desencontros e os limites. Somos animais sociais, existem cooperações, solidariedades. Insisto,porém, que a lógica capitalista é destrutiva. Ela estimula a vaidade e o desdém pelo outro. Isso transtorna e mistura os valores. O mundo atravessa por estradas cheias de pedras. Há desenganos ferozes, risos de hienas mascaradas, disputas que multiplicam o mesquinho. Valem: discurso do sucesso, o excesso na competição, as palavras de um zap traiçoeiro.
Não se alcançou o que os iluministas profetizam. O mundo vive guerras, desenvolve ruínas, monta espetáculos perversos. Quem não observa as provocações, o desprezo, o deboche? Tudo no espaço dos sentimentos mais íntimos. As idades afetivas estão obscuras. Os filhos de Jair balançam maldades e gostam de levar vantagem. Não possuem o andar da dignidade. Não se trata de jogos políticos, de ambições por cargos. Eles exercitam o desfazer, a falta de sensibilidade. Parece estranho, porém os noticiários não negam as chamadas pegadinhas da família Bolsonaro. Elogios a ditadores e agressividades festivas compõem um quadro sem luz para quem proclama a honra das famílias. O que significa?
As surpresas mostram os limites da sociabilidade. Muitos não percebem que há práticas que arruínam. Se o ódio se expande as epidemias do medonho não cessam. Desmontar sentimentos, conseguir adeptos, atiçar vulcões. Fica a marca do vazio. Alguém não se toca com as lágrimas, alguém se acha senhor das ações. Desconhece o inesperado, porque desconhece as idas e as vindas da história . O que se pretende estimulando o ressentimento, desqualificando os outros no anonimato das redes sociais? Freud tinha razões para afirmar o inconsciente e a agressividade. Quantas relações há guardadas e prontas para explodir o individualismo?
Se o limite nos acompanha, temos que não sucumbir diante das suas amarguras. O absoluto aparece nos sonhos, porém as dores não se vão das histórias e os afetos atraem contrapontos. Negar a ambiguidade é trazer o mito como espelho indiscutível do humano. Ele é uma narrativa dos escorregões e das possibilidades. Consagrar armadilhas para afundar os outros é ampliar os abismos e desmanchar futuros. Os sentimentos denunciam comportamentos. A saciedade governada pelo incentivo à desigualdade não escapa de mergulhar no pântano. Não há vacina para quem se banha com as atmosferas perversas. Amanhã será outro dia de qual calendário?
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Maravilhoso!
Maravilhoso!!
Grato
Mestre, como sempre muito eloquente.
Tenho, há algum tempo chamado a atenção dos aprendizes sobre crença nos mitos de progresso e desenvolvimento, herdados do iluminismo! Na experiência cotidiana, está sendo desafiador, seguir com as utopias, que desejam um mundo com mais equidade.
… acredito que perguntar o que se ganha ao agredir, diminuir e zombar do outro é significativo demais, a resposta é assustadora. Ora, se ganha a presidência da república, se ganha o governo de um ou alguns estados brasileiros, se ganha um lugar no parlamento, no grupo de ministros que compõem o governo Bozo, se ganha poder e prestígio político. Estamos nos novos tempos do nosso tempo e as descontinuidades estão aí. O poder está nas mãos dos desabilitados com o manejo da administração pública, contudo, nas mãos de pessoas extremamente habilitadas em manejar e manipular o ódio como um sentimento comum importante na questão da representação pública. Refletir sobre os novos tempos do nosso tempo é por demais necessário, pois precisamos entender que há uma racionalidade na manipulação da violência que estar dando muito certo, é preciso agir com sabedoria para extermina-la ou ao menos amenizar os seus efeitos sobre os corpos de uma sociedade sem um projeto político de melhora social para tod@s, os tempos de decadência e competência intelectual estão aí. Como reagir aos seus danos?…