As críticas, os saberes, os espaços de contraponto

Dizer que a sociedade é democrática como se sonhava é uma falta de olhar atento. As conquistas não foram poucas. As épocas possuem seus valores, mas também se luta para modificá-los. Nem sempre a resposta traz satisfações para maioria. Isso não é, apenas, da contemporaneidade. É uma travessia histórica e inquieta. Convive-se com incompletudes, daí os projetos e os devaneios. Não há absoluto a não ser nas fantasias de cada um. Portanto, a democracia se produz com lacunas. O importante é não deixar se enganar pelos modelos. Manter a crítica acesa e avaliar os limites. Os mascarados gostam de exibir seus disfarces e vender suas astúcias.

No mundo intelectual, as divergências sobrevivem, animam a troca de ideias. Pensar igual é quase uma condenação. Há uma ordem vitoriosa e outras pessoas que a transgridem. Sem os contrapontos a monotonia ganha espaço. O debate atiça a razão e a sensibilidade. Pode-se aprender de forma tolerante, sem querer formar tensões. A raiva significa, muitas vezes, um descompasso afetivo que assombra o sossego e dilui a sociabilidade. Para que os contrários se estabeleçam não é preciso espernear e gritar que adquiriu o caminho de todas as certezas.

A competição faz parte do capitalismo. Não se deve negar seus estragos, nem renunciar ao direito de defender-se. As discussões não estão presentes, apenas, nas academias gestoras de saberes. No mundo das informações, os conhecimentos circulam velozmente. A diversidade é imensa. Os choques são comuns. Os comportamentos variam e não correspondem, somente, ao  configurar das reflexões. O emocional também traz instabilidades. Muita  gente, porém, se acha senhor da objetividade, tem dificuldade de promover as mediações e estica a corda sem medir os desacertos. Criam-se debates onde se movem disputas de poder e não busca de esclarecimento.

Vive-se a controvérsia na mais simples aventura do cotidiano. Ela assanha a vaidade. Esquece que a conversa tem seu ritmo. Nem se arrisca a estimular a sabedoria, nem percebe que está longe de ampliar a famosa utopia democrática. Multiplicar divergências, ativar novas perspectivas metodológicas, ampliar temáticas ajudam a construir um saber mais aberto e menos ressentido. A grande questão é a ligação saber e poder. Numa sociedade hierarquizada, há lugares privilegiados. O controle da mídia fortalece a construção de verdades que estão longe do exercício da tolerância. Muitos aparecem como guias da opinião pública. Isso também existe nos centros mais sofisticados do saber.

É importante conviver com a diversidade, mas não fazer um abismo onde tudo se joga, sem cuidar de olhar o outro e escolher a liberdade de ativar questões. A censura não deixou de se afirmar. Ele inibe e funda preconceito. Não precisa ser oficializada, sistematizada em leis. Ela atua nas páginas dos jornais, nas discussões políticas, nos inúmeros blogs que se lançam na aldeia global. Quem se lembra das críticas dos frankfurtianos, não perde de vista os malabarismos usados para firmar ordens. Não há como criar a ilusão de que a democracia se fincou, pois a ordem hegemônica se harmoniza com práticas autoritárias.

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