As estratégias de sobrevivência e os controles cotidianos

Há uma insatisfação com a vida cotidiana que toma conta da maior parte da população. Existe quem reclame de mais privilégios, sente-se invadido em sua residência pelos ruídos da rua, pelo tumulto causado por mendigos habitantes da praça. Mas há quem exija o mínimo e nem sequer  visualizar possibilidades de mudança. Os ônibus representam o descaminho do transporte público e a questão da coleta do lixo tornou-se lugar de intriga política. Promessas não faltam, pois os olhos nas eleições futuras estão firmes. Já se fala, com intensidade, no fim do governo de Dilma. Aparecem candidatos procurando espaço na mídia, com conversas sinuosas.

A sociedade mantém sua divisão. Ela se aprofunda esticando as ilusões. O capitalismo financeiro articula-se com o consumo, as crises se concretizam, porém as especulações não cessam. As grandes festas agitam os cartões de crédito. O mundo da dívida se alarga, ornamenta misérias, poucos se ligam aos princípios da cidadania. As liquidações ocupam manchetes. É o culto profano que motiva e distrai multidões, multiplica os descartáveis e significa o passeio ambicionado das famílias. Tudo se entrelaça, com uma eficiência  manipulada.

Assim, segue a história no século XXI. Talvez, as tecnologias nos redimam de certos impasses, contudo a competição quebra ritos de companheirismo. Sobram mecanismos de fuga, pois a globalização facilita a mobilidade dos famosos. Tornam-se figuras idolatradas. Procuram os chamados paraísos fiscais, destacam ações filantrópicas, aliam-se com os políticos profissionais sem vacilação. Como transformar o cotidiano da maioria se o mundo vencedor fortalece as desigualdades, silencia diante da iniciativa da reformular o ir e vir da economia? Nem todos adotam as hipocrisias avulsas, porém desconcentrar não é um verbo celebrado.

Cada canto da cidade assume um valor de troca. As fronteiras entre o privado e o público são tênues. Manifestações se realizam, com debates nas redes e protestos nas ruas. Os movimentos sociais passam por um momento de fragilidade. Com o ruir dos partidos, a dificuldade de administrar os sindicatos e costurar rebeldias, as relações estão tensas, as críticas atingem o sistema, mas para romper o controle dominante falta muito. Consolidam-se outros valores, a modernidade se sufoca com seus antigos paradigmas, o emprego é um precioso bem que não merece sofrer riscos. Mesmo assim não há acomodação e indiferença geral. A sofisticação espalha-se e a vigilância sobre a vida de cada um conta com artifícios complexos.

Os sentimentos ganham espaços de discussão, porque aumentam os descontroles psicológicos e os afetos se misturam. A força da mercadoria traz uma coisificação extravagante. As  conversas soltas, nas esquinas, nos bares, nos bancos de praça não possuem a magia de  antes. Há sempre muito que fazer. Novas manias, onde as máquinas substituem os amigos, prevalecem. O fascínio dos computadores é abrangente. Aprendem-se outros vocabulários para  navegar na internet. Acontecimentos velozes que não pedem reflexão. Como sobreviver sem desfazer-se das inquietudes é uma pergunta que incomoda. Não é à toa que as drogas alimentam grupos de convivência. As drogas permitidas e as ilícitas, nos becos ou apartamentos de cobertura, mergulhados nos disfarces.

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