O avesso da cidadania e o poder público descuidado

O depoimento de  Carlos Macedo, pai de Matheus Macedo, vítima do acidente ocorrido no restaurante Filé Carioca, é contundente: Ele é vítima da incompetência do nosso governo, que não fiscaliza nada e só quer saber de ganhar dinheiro, levar o dinheiro. E segue:O Rio Antigo está caindo aos pedaços e os governantes só querem saber de Copa do Mundo. Traz o sentimento de uma dor radical, mas denuncia a falta de cuidado do poder público nas ações básicas. Tudo aconteceu, na semana passada, e assustou pela repetição. Além do susto, fica a insegurança. Isso não é passado.

 As cidades continuam aumentando suas populações, sem melhorar as condições de vida. Há preocupações com espetáculos, viradas culturais, shows em praças públicas. A diversão faz parte da vida. É importante mantê-la e socializá-la. No entanto, milhões são gastos com a promoção de eventos e pessoas morrem por falta de atendimento médico. Não precisa escolher um dia especial. Os jornais estampam notícias que causam espantos. As cidades parecem minadas pelos descontroles das administrações. Quando surgem as tragédias, as investigações não apresentam alternativas eficazes. Há uma forte tendência ao esquecimento.

No mundo atual, a velocidade dita ordens, em nome da novidade. Vale o culto ao supérfluo. Tudo ganha a forma de vitrines. Descartam-se as estruturas, consagram-se os ornamentos. Por isso, os desastres sempre retornam e, às vezes, nem mudam de lugar. Alimentam o sensacionalismo da imprensa. Reforçam a instabilidade. A sociedade aprende a se defender e não a observar a valorização das práticas democráticas. A cidadania tem cores cinzentas, a política se veste da vaidade irresponsável, minimiza as contradições e aponta para o pão e o circo. Uma outra forma de espalhar o conteúdo das drogas.

Não podemos, porém, escancarar, apenas, os cinismos do poder público. Há convivências e conveniências. Existem eleições, partidos, sindicatos, ONGs, associações. A população possui  órgãos de reivindicação. A ética política não é uma construção isolada. A competição, que corre solta pelos espaços da globalização, alicia desejos. O poder de pressão diminui ou se desloca, deixando de lado a crítica ou desconhecendo os caminhos da cidadania. Se não se destaca o coletivo,  a política se torna uma passarela de imagens vazias. O efêmero da moda dispensa a reflexão e enaltece a mobilidade dos cartões de crédito.

O volume de sociabilidades fragmentadas cresce. Olhar o outro como coisa e afirmar sempre o quantitativo não garantem que a história anuncie possibilidades de reviravoltas. Não é toa que os conflitos invadem ruas, regiões, crenças. Fica-se no impacto do momento, sem se ressaltar que o presente dialoga com o passado. Parece tão óbvio, contudo as leituras são outras. Enquanto a pedagogia do descartável não esgotar suas armadilhas, os que exercitam a manipulação disfarçam os pesadelos que podem compor  o futuro. Lembra Eduardo Galeano: Os gregos e os romanos já sabiam que o chumbo era inimigo do sangue, do solo. do ar e da água. No entanto, alguns países continuam agregado chumbo à gasolina. Uma simples lembrança que a história é uma travessia que não se faz sem memória.

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4 Comments »

 
  • Emanoel Cunha disse:

    Toda a composição da vida é feita de erros, muitas vezes de atropelos e outras também são realizadas com acertos. Todo os planejamentos que se afirmaram e construiram a sociedade, trouxe com ela quadros tantos positivos como negativos em suas estruturas. Parece que estrutarar a mesma nos dias atuais se torna difícil, aliás ficou mais complexo distingui-las de acordo com sua atuação pérante as fragmentações sociais hoje existentes.

    Todavia é preciso estarmos atentos à sua direção, pois a mesma em suas idas e vindas na história nos dão a noção de compreendermos as problemáticas que são propostas para reconfigurarmos suas travessias sinuosas.

  • Emanoel

    Sua reflexão dá conta dos caminhos. Há erros, mas não custa ter atenção redobrada.
    abs
    antonio

  • Paulo Marcelo Mello disse:

    Como reforço digo que sexta-feira passada , acompanhei minha esposa, que é professora da Prefeitura , na festa dos professores da rede .No meio do evento sobe ao palco o “grande ” Prefeito J. Costa , para informar que decretaria feriado na segunda(17/10/11). Fiquei impressionado com a reação dos professores, apesar dos salários ridículos,péssimas condições de trabalho , sem espaço,sem segurança, praticamente todo mundo apoiou o Prefeito.
    Muita mediocridade e falta de censo de cidadania.

  • Paulo

    Pois é. Falta apoio para uma mudança consequente, a educação sofre um desamparo enorme.
    abs
    antonio

 

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