O silêncio é ruído: Ulisses e as andanças no facebook
O cotidiano não é tão implacável como dizem. É difícil uma vida plena de surpresas, sem aparecimentos de repetições. Não conheço quem tenha posse de um território onde tudo é novidade e renovação de paraísos. A cultura está cheia de invenções. Precisamos superar os impasses, redesenhar as geometrias, sacudir a poeira de conceitos. As ambivalências continuam, a uniformidade não faz parte das configurações. As conversas mudam de lugar, mas falar com o outro ou falar do outro não é esporte acidental Todos convivem com as sociabilidades. Portanto, as andanças no facebook servem para celebrar congregações ou colocar ruídos na solidão.
Já mencionei, em outros textos, a existência dos preconceitos, das perplexidades. Quando muda a forma de dialogar ou, simplesmente, ampliar a ressonância de uma fofoca, a sociedade assanha sua imaginação. O telegrama, o telefone fixo, o e-mail, o celular trouxeram charmes, vícios, desconfianças. Até as palavras passam a buscar sentidos, fugir dos dicionários antigos. A gramática recebe visitas que pedem urgência nas transformações das regras. No entanto, existem os ritmos, os tempos e os desejos de cada um. Com não esquecer as diferenças, apesar da avassaladora massificação? Temos lamentos próprios, amores com singularidades inexplicáveis.
Gosto de observar e escrever. Misturo as coisas. As histórias são contadas para decifrar mistérios ou torná-los mais distantes. Não se necessita de pesquisas em acervos imensos, em discutir a validade das fontes, em formular hierarquias da verdade, para que a narrativa histórica flua e ganhe espaços desconhecidos. Há os contrapontos, as preferências, os saberes privilegiados. As notícias circulam, os segredos se desmancham, a inquietação solta emoções. As histórias são muitas. Não morrem na objetividade acadêmica. Elas se movem abrindo e fechando portas, construindo e desmontando argumentos. Numa sociedade com sofisticações e desigualdades, não podemos esquecer que há conflitos e insatisfações permanentes.
O facebook será substituído por outras formas de estar no mundo. Tem seu prazo de validade. São muitos sentimentos, abismos, arrogâncias disfarçadas, imaginações atiçadas. Vamos no face e largamos as coisas. Nem sempre as expectativas se completam. Muitas vezes, a solidão aumenta, desistimos. São os contratempos. Mas é só no facebook que se dão essas contrariedades? Há tantas situações que nos balançam. Viver sem as instabilidades é inventar cavernas para além das platônicas. A cultura incentiva as continuidades, porém traz instigantes descobertas, reforma hábitos, aparentemente, insubstituíveis. O facebook é uma invenção humana, não é neutro e nem isento de dissonâncias
Contando as histórias, nos mais diversos encontros, as pessoas duvidam que o mundo seja tão concreto como alguns pensam. Há quem não queira indefinições. Apostam no lugar comum, reverenciam a apatia. Não era, assim, em outras épocas? Basta uma olhada na confusão que reinava entre os deuses gregos? E as justificativas para fermentar a competição do capitalismo? Somos provocados a fazer (re)leituras do mundo. As identidades possuem fronteiras frágeis. Andamos ou navegamos no facebook, acendendo ânimos, quebrando memórias. Os espelhos mostram rostos que não são mudos. Ulisses vivia enganos e astúcias. O oceano é imenso e tem a cor dos nossos olhos.
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