O verbo ocupar, o substantivo ocupação
As palavras acompanham as andanças da história. Nem sempre é preciso inventá-las ou mudar sua vida nos dicionários. Ninguém consegue comunicar-se anulando os múltiplos significados que possuem. Os sinais e a mudez podem ser compreendidos a partir de seus malabarismos. Deus não fez o mundo. Ele o disse, com solenidades supremas: no princípio era verbo. As dubiedades não deixam de existir. O que é mesmo masculino? O feminino é a fotografia da sensibilidade? Por que articular os discursos, se cercar de proteções das gramáticas? O mundo é um conjunto de signos ou o mundo é o mundo, a residência de anjos, demônios e humanos? Não sou apóstolo.
Cada época dança seu ritmo. Há quem goste de valsa, quem se encante com Piazzolla. Não adianta hierarquizar. Quando se falava se ocupe, a casa balançava, a preguiça sorria. Hoje, com outros ruídos, fortes desempregos, descontroles, está desocupado é um suicídio. Deprime, desampara. Buscar o ponto final da história é ser escravizado por devaneios. Há tantas coisas e sentimentos vazios. O movimento é constante. Não adianta se distrair com uma ingenuidade fabricada. Brincar não é mais uma arte. Virou um negócio que desacredita qualquer iniciativa de inocência. Não venda seu avião para um estranho, nem desmanche suas utopias. A confusão é imensa.
O mundo precisa de ajuda e nós também. Os objetos tecnológicos são graciosos, espertos, complexos. Não basta detalhar suas minúcias. Elas terminam sugando a nossa imaginação. O que pretendemos: flutuar no tapete mágico, conhecer as estrelas, desenhar a artista do filme, entregar a pizza do vizinho? Não faltam opções. Estamos nas fronteiras dos limites. Quem ocupa e não reflete pode estar mergulhando no incontrolável. Assim, corre a especulação dos que se julgam sábios. A sentença talvez seja um escorregão. É fundamental, então, escutar a solidão, olhar o próximo, cultivar a autonomia, sentir o afeto descongelado.
O pior é ser ocupado, deixar que a crítica morra.A perfeição não existe, mas há quem a deseje. Todos estão cercados por descartáveis. Os reis não conseguem manter a majestade. Trump promete abalar os Estados Unidos. A ocupação conservadora é uma ameaça a quem curte o voo dos pássaros. Não possui as promessas, nem o futuro. A sociedade inventa sem cessar. Os cansaços são comuns. Não aposte no definitivo, não conspire contra a imaginação. A rebeldia encanta, traz inquietações. Muitos conseguem segurá-la, outros optam pela nostalgia. A vida não tem cartas marcadas. Não se lê livros, como se lê o mundo.
Nunca me esqueço de Édipo. O sofrimento que o marcou não se foi. Corta o corpo, desenha espantos. Os mitos gregos deveriam estar em cada esquina. Seria uma ocupação revolucionária. Já pensou certas pessoas conversando com Prometeu? E a sedução de Afrodite? Mas isso é um delírio. A reflexão fica na vitrine dos condenados, muitos se vestem de poder quando ainda usam fraldas. Quem resolveria tantas equações? Gostaria de cuidar de um encontro entre Nietzsche, Marx, Freud. Ocupá-los com as angústias da época. Escolheria um lugar sossegado, sem luz, com velas acesas e moinhos de vento.
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