Neymar e o espetáculo na arte da bola

 

Neymar está confirmado como craque. Não parou. Consagrou-se cedo. Houve muitas conversas, quase ia para Europa, mas se manteve no Santos. Não sabemos como se concretizam as negociações, nem os  malabarismos ativos dos bastidores secretos. Quem produz espetáculo possui lugar privilegiado, numa sociedade que vive aumentando o circuito da mais-valia, exaltando sua força de sedução. A qualidade sofre metamorfoses, engana,  afinal a sociedade de massas gosta de delírios e de agitações. A crítica não é artigo de primeira necessidade, pode até prejudicar as ambições e quebrar as vitrines tão valiosas.

Neymar não conseguiu, ainda, deslumbrar vestindo a camisa da seleção brasileira. Faltam alguns aprimoramentos, porém não se deixou fixar na mediocridade da maioria. Gosta da arte, dribla, inventa, ri. Não se pode negar que a mídia lança suas modas e festeja o sucesso. Isso não é tudo, porque há quem sucumba e pense que as relações duram eternidades. Para regras existem exceções, um expressão que não fica velha.Depois que o capitalismo entrou para valer no mundo do futebol houve mudanças sensíveis.

Os jogadores vivem numa gangorra infernal. Desconhecem como o mercado funciona, pois são gerenciados por empresas que promtem cuidar do futuro. Aquele apego ao clube de origem tornou-se uma fantasia. Alguns manifestam seus amores, contudo a credibilidade é baixa. Quem se envolve com a fama não consegue esconder a ansiedade. Com dezesseis anos estão na berlinda, com promessas de viajar para Europa e a garantia de milhões. Difícil é manter o juízo, com dizem os mais velhos. O assédio é grande, os sonhos se avolumam, os possíveis fracassos nem são lembrados.

O exemplo de  Neymar é raro, porém as surpresas ocorrem, não vamos descartá-las. Viajemos pelas histórias recentes. Por onde anda Adriano, o artilheiro infernal? Suas oscilações são comoventes, parece, ainda, estar preso nas instabilidades da adolescência. Ronaldinho abraçou o Flamengo e luta para prosseguir no time de Mano. No entanto, sobram dúvidas sobre suas atuações e muitos revivem o talento que demostrou no início da carreira. É um enigma. Apaixona e provoca a ira dos rubro-negros.

O futebol tem as inquietudes do cotidiano. Usa roupas verde-amarelas brilhantes. Disputa espaço com assuntos diversos, seus escândalos mobilizam a ação da imprensa, seus detalhes produzem polêmicas. Traz o fascínio da riqueza fácil, da redenção, do descanso das opressões do trabalho, justifica desconfortos e reconstrói alegrias. Visitando sua memória, encontramos aventuras épicas e desastres radicais. É importante analisar como ele entrou na sociedade do consumo e move negócios imensos, devidamente, globalizados. Relativiza, até mesmo, a concepção de nacional, desloca identidades e costumes.

Suas medidas estão além dos encantos dos espetáculos. Há um mundo aberto e veloz que sobrevive nos artifícios do futebol. Nem tudo é cristal. Há violências, manipulações, ilicitudes. A sociedade contemporânea não renunciou aos paradoxos. O futebol não está fora dela. Por que vê-lo como estranho ou especial? Neymar exerce a profissão, procura desenha uma trajetória, mas não será o último a lembrar que existe invenção e arte no jogo. O fundamental é compreender os contrapontos que cercam as caminhadas da cultura. O presente não diz tudo, nem é a porta maior da vida.

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2 Comments »

 
  • Flávia Campos disse:

    Antonio,
    Seus últimos textos entrelaçam os tempos ao cotidiano e nos diz que ou no futebol ou na vida, “o fundamental é compreender os contrapontos/as incompletudes que cercam as caminhadas…”(…)
    Que “o presente não diz tudo” e que “a busca da felicidade não está ausente do mundo que vivemos.”
    É sábio reconhecer/distinguir pulsões de vida e de morte.
    Aprender com Pamuk a não perder “o encantamento” (…) a “conversar com o mundo sem aumentar a voz” , “sem se assombrar com o paradoxo.”
    Perceber-se inquieto, dialogar, narrar, “abraçar-se com a complexidade, remoer, esconder fatigas e inventar metáforas”.
    E descobrir no campo ou na vida, que o jogo, para além dos encantos do espetáculo, vale pelo que se aposta no ser humano, no movimento do coração, na crença que “cada instante desenha seu símbolo, arquiva memórias astuciosas.”
    Cada instante pode recriar o amanhã.
    Um amanhã (como canta Guilherme Arantes), que “há de vingar”, uma “luminosidade, que alheia a qualquer vontade há de imperar”, e a “esperança, por menor que pareça, existe e é pra vicejar.”
    “Mesmo que uns não queiram
    Será de outros que esperam
    ver o dia raiar”.
    Será dos que conseguem enxergar as cores do mundo.
    “O mundo é azul
    o eu, uma parte mínima do azul” (…)
    Será dos que pintam com a sua voz, com o seu canto, com a sua palavra,
    “o desenho do humano no tempo.”
    Gracias, Antonio!
    Bjs
    Flávia
    PS:Por favor, não deixe que a poesia só apareça, no seu blog, de forma passageira. Deixe que ela atenda a voz do acaso, mas principalmente, que ela expresse a magia da vida, o desejo do reencanto, o “desfrutar dos sabores da eternidade”.

  • Flávia

    Você sempre traz um ânimo e uma interpretação articulada com cuidado. Uma leitora que vai além do texto e conhece bem os entrelaçamento da vida. Grato. Isso produz diálogo e vontade de seguir adiante. Ajuda-me substancialmente.
    bjs
    antonio paulo

 

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