O inesperado e o trágico flutuam na história

As discussões são intermináveis. Muitos querem dar um sentido para a história, colocá-la no meio de regras, fazendo relações entre causas e consequências. Há quem faça profecias, abrace-se com superstições e apele para divindades supremas. Considero que a história  é  a construção das possibilidades. Observo que o inesperado e o acaso nos deixam perplexos. Mas não vejo como cercar os acontecimentos com previsões e geometrias exatas. Há surpresas, ficamos atônitos, as mudanças quebram expectativas e mostram que as turbulências chocam e desmantelam. Não adianta se fixar na trilha de um juízo final ensaiado e decretado pelas escatologias.

Uma longa introdução? Talvez, porém gosto de refletir e não me apegar ao fato sem especulações. Afirmar que as mortes de Eduardo Campos e dos seus companheiros trouxeram uma reviravolta na campanha política não é tudo. É preciso também salientar que provocaram grande consternação. O acidente foi de uma crueldade ímpar. Deixa dores e saudades que não se vão com facilidade. Há muito que lamentar. A vida se despedaça repentinamente como um pássaro que se perdeu no voo. O sentimento sente-se abalado e não há como dispensar as ansiedades que tanto nos empurram. As dissonâncias compõem as (des)continuidades.

Os espaços da política e do afeto são espaços da história. É um equívoco querer radicalizar as fragmentações e não assinalar a existência do inacabado. Tudo se relaciona. Isolar, medir, encher-se de certezas e vitrines trazem descompassos e insensibilidades. As discordâncias não devem ser anuladas. porém não significam a consagração de ressentimentos. Discordamos, porque a cultura tem uma arquitetura colossal e pede atenção profunda. Não existe um mapa perfeito do que vivemos. Somos rascunhadores, nossos desenhos amenizam sofrimentos e traçam adivinhações parceiras das incompletudes.

As disputas continuam, as perdas são repensadas, as lacunas mostram que não se pode desprezar a crítica e visualizar a democracia como uma competição simples. Há o que se aprender na pressa desse mundo contagiado pelas notícias e  imagens. A memória tem fantasias, merece ser avaliada nas suas diversas cores. As coisas podem parecer soltas; não custa, contudo, encontrar ou buscar as conexões. A morte silencia e atiça ruídos. Não é um ponto final. Os mistérios cobrem as histórias de cada um,  bordam e desnudam o tempo. Esquecer e lembrar é um diálogo que não se encerra e ilumina caminhos.

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3 Comments »

 
  • DIÓGENES disse:

    Uma das grandes questões que se fica é de como lidar com o sentimento da perda na história. A comoção da morte de Eduardo Campos, principalmente pela forma trágica que foi, doeu bastante no estado, a forma inesperada dessa tragédia tocou bastante nos sentimentos da população de Pernambuco.
    Agora todo esse sentimento não deveria ser utilizado como forma de campanha política, que é justamente o que esta se desenhando. Os interesses politicos sempre sobressaem os sentimentos, a afetividade.

  • Diógenes

    A política termina sendo um grande jogo. Muitos se aproveitam para ganhar espaço, nem pensam nas dores e nos sentimentos. Isso é lamentável, mas não deixa de existir.
    abs
    antonio

  • anuska disse:

    Maravilhoso mais uma vez. Fico encabulada até de comentar, as emoções sempre são as mesmas, um dia mais e o outro mais e mais. rsrs.

 

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