Os malabarismos da política e as expectativas cotidianas

A conciliação é difícil num mundo múltiplo e confuso. Está tudo repartido e mesmo a massificação  frequente não apaga as polêmicas. Por mais que se promova a homogeneização, sobrevivem reflexões e ansiedades. É sempre importante lembrar que a história é o território do inesperado. Há muitas surpresas que rompem com a monotonia do cotidiano. A velocidade das mudanças é grande. Não são mudanças radicais, porém  e desenham turbulências. Recentemente, a sociedade brasileira foi atingida por movimentos que trouxeram perplexidades. As ruas passaram a ser cenários de inquietações. Quebrou-se a calmaria. Esticou-se a corda de proteção. Abriram-se olhos desencantados.

Desconfortos se misturaram com críticas. Alguns se atemorizaram. Circularam notícias de perigo da conspiração, da ação articulada das chamadas forças ocultas. Fica complexo assinalar as distinções, num espaço em que os oportunismos constroem ninhos. Nem sempre a clareza se espalha e firma convicções. Estamos cercados por incertezas. As cidades não se cansam de mostrar instabilidades. Os ruídos não apresentam, apenas, máquinas poderosas. As pessoas protestam e querem outras relações. Muitas vezes, as dissonâncias têm conteúdos que aproximam e agrupam ideias. Outras vezes há palavras soltas, com significados mascarados ou projetos desencontrados.

Se as sociabilidades se balançam, é preciso instigar decifrações. A diversidade convive com fragmentações. Os ruídos têm ritmos. Negam os governos, acusam os corruptos, anunciam utopias ou não conseguem mostrar o conteúdo renovador de suas indignações… Dizeres sobram, articulações costuram diferentes visões de mundo. As insatisfações invadem as mentes e os corações. Os que defendem uma lógica para cada acontecimento perturbam-se com as idas e vindas das manifestações. Surgem teorias explicativas, porém as informações se conflitam. As leituras da vida esquecem identidades sem definições. Não é novidade, apenas, dos tempos modernos. Atravessa a história.

A questão da violência embarcou nas discussões.  O patrimônio público sofreu ataques, a polícia reprimiu, a imprensa explorou as contradições. Uma pergunta não se ausentava: o que é mesmo violência? A sociedade capitalista não existe sem o uso da exploração e da desigualdade. Portanto, não é incomum encontrar a violência na forma de tratar a saúde ou responder aos apelos dos desfavorecidos. Os significados simbólicos não devem ser jogados fora. Numa sociedade democrática, as políticas mudam de cores, mas o diálogo é fundamento da sua permanência, possibilita escutar e minimizar soberanias. Portanto, não custa cultivá-lo, anulando isolamentos.

Os ruídos diminuíram. O governo tenta evitar maiores transtornos. Persistem dúvidas. Muitos políticos parecem insistir em velhas fórmulas. Ficaram acuados, temeram o fim de privilégios, curtem os malabarismos. Estamos longe de levar a democracia para uma socialização da riqueza material, da cultura e do poder. Os monopólios continuam acendendo suas luzes. Há leis e regras que, na prática, pouco testemunham sobre o interesse coletivo. Vislumbrar uniformidades não cabe numa sociedade repleta de armadilhas. Prever é sempre um risco, mas a política deve acenar para o social, construindo alternativas e reinvenções. A mobilização faz parte da história, como também a autonomia  e o conhecimento das necessidades coletivas das instituições, com seus limites e suas possibilidades.

 

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