A felicidade mora na minha esquina?

Caminho pela rua. Fico observando quem passa, o movimento dos carros. Sinto uma invasão de ruídos e a perplexidade de que a vida se vai. Não tem como segurar o tempo. Ele costuma aprontar. Isso não muda. Lembro-me das histórias de Ulisses, vejo alguém pedindo socorro e mais um celular solto no chão. Gritaria, suspense, agonia. Uma inquietação que foge rapidamente. Lá estou na esquina seguindo minha trilha diária. O dia começa assustado. A sociedade não se equilibra. Compartilha instabilidades profundas. Resta agir, desconfiar, perceber que o mal existe, que os anjos choram, que a arrogância chama privilégios.O perdão é uma fruta com uma forma mutável e um sabor que adormece. Os deuses se enchem de  nós e os templos se vestem de promessas. Não estranham os cartões de crédito.

Sou historiador ou alguém que se preocupa com as ambiguidades humanas. Resolvi mergulhar nas questões da afetividade. Debato e dialogo com muita atenção. Sou contra as subtrações. Divido e somo com prazer. Minhas aulas me ajudam a aprender. A atmosfera não é nebulosa. Respiramos coletivamente.Não cultivo egoísmos, tenho minhas contradições, mas nada como a leveza e o bom humor. A felicidade não mora na esquina. Ela diverte os que sonham em aprisioná-la. Tudo é uma grande ilusão com a sede de conhecer paraísos que inexistem. Há momentos de euforia nunca perpétuos. Conta-se o que se imagina para manter a energia mínima do poema e da beleza. Não custa desengana-se, piscar para quem se fecha na vaidade.

A sociedade nos empurra para competir. A opressão é, às vezes, sutil. No entanto, o sufoco se aproxima, tira a paciência, configura desamores. Considero as relações afetivas o nó das convivências. É importante não trocá-las por grana e se deixar inundar pelo brilho das vitrines. Conversar é uma saída. Não entrar na disputa, escondendo os golpes. Quem assessora a mobilidade do capitalismo deseja que ele se modifique? A escolha profissional transforma e produz desgovernos internos. Uma aventura para a memória, pois o esquecimento desfaz as lembranças e as certezas sucumbem. Como, então,  saltar os abismos, se o fingimento domina nossas ações? Como arquitetar a política se o projeto da vitória isola e aumenta as tensões?

Na sala de aula, retomo meu cotidiano.Envolve-me com uma pedagogia que critica, que limpa os ressentimentos e escuta sem temer o silêncio. Guimarães Rosa disse que viver é perigoso. As curvas dos caminhos revelam verdades estranhas. Construímos armaduras, não olhamos a dor dos outros. Escapar do individualismo é um risco constante. É fundamental liberar as queixas, suspeitar de quem se considera o salvador. Os escorregões não são propriedades privadas. A dificuldade circula e a fragilidade da alegria traz dissabores. O mapa da vida não termina nas fronteiras ou nos mares quietos. Nas minhas conversas,  não nego que a transparência é rara e o desamparo nos ameaça. Reprimir o riso é, contudo, uma condenação.

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