Jobs:a cultura reinventa-se, a morte impõe limites
Nem tudo se degradou. Na sociedade do consumo e do espetáculo, há lugares para criatividade e alegrias. Não vamos mergulhar naquele pessimismo que risca o futuro e desfaz qualquer lembrança de utopia. Sabemos que as lacunas existem e elas não são propriedades exclusivas do mundo em que vivemos. Não dá para acreditar num progresso definido e consagrar euforias oportunistas. Os contrapontos compõem a nossa sinfonia, desde os primeiros tempos de ousadia e astúcia. A morte de Steve Jobs trouxe lamentos. Foi uma perda incomensurável. Sua singularidade marcou uma época e não se extinguiu. Quem inventa e sonha, permanece, atravessa tempos e se transforma numa eternidade que ilumina a cultura.
Jobs deixou comoções cósmicas. Estava conectado com as imaginações mais profundas do seu tempo. Não quis pacto com a mesmice.Transgrediu. Pensou em máquinas inteligentes e rápidas, sem contudo desprezar as dimensões estéticas. A novidade existia, mas também o fascínio. Não optou pelo descartável vulgar. Conversou com as necessidades mais urgentes, sempre de olho no diferente, no pacto com o extraordinário. Suas invenções, contudo, entraram no cotidiano e entusiasmaram milhões de seguidores. Todos agradeceram sua coragem, alguns, de forma religiosa, construíram altares. O câncer de pâncreas impediu a continuidade da vida, porém ele está inserido, na cultura, com uma maçã simbólica que não perde sua cor.
A articulação da ciência com os rumos do capital é visível. Faz parte das aventuras do capitalismo. As mercadorias movimentam as vontades, acumulam fortunas. Ninguém é ingênuo. Afirmar que o conhecimento é neutro esconde as relações de poder. Com pensar uma sociedade complexa sem políticas e instituições que a controlam? As bombas atômicas causaram estragos incomensuráveis. As armas de guerra trucidaram pessoas, praticaram genocídios, em nome de imperialismos e vaidades. No entanto, não só de violência sobrevive a cultura. Steve era um homem de negócios, porém não seguia a banalidade.
Sua empresa foi fundada numa garagem. Quem iria profetizar que as suas vendas superariam 100 bilhões de dólares? Conseguiu, com liderança, firmar comportamentos. Há quem o considere o criador de um modo cultural que abraçou imaginários e expectativas inesperadas. O homem da Apple que divulgou sua criatividade estreitando as proximidades entre as pessoas. Não podemos, contudo, anular os limites. Há quem use as máquinas para fundar individualismos e concentrar riquezas. A diversidade de buscas e ambições ganha projetos que, muitas vezes, se chocam.
A revolução foi feita, com os cuidados de Steve, e a informática consagrou, mais ainda, sua soberania. A aldeia global não dispensa seus produtos. Alarga seus interesses e seus redes sociais. Tudo é possível: rebeldias, fofocas, tramas, amores, desperdícios, cinismos… Estamos cercados de invenções. Temos que formatar estratégias de vida que tragam vantagens solidárias e não reforcem o narcisismo. O sucesso dos produtos da Apple é indiscutível. Traduzem fantasias e reflexões. Lançam desafios que Steve, talvez, nem esperasse. A cultura não se constrói sem significados. Ela não está solta. A luta entre grupos corporativos é um fato. Não recusemos, contudo, a celebrar os encantos mágicos de cada transcendência. É uma forma de jogar, no lixo, o mesquinho.
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Antônio,
Excelente texto. O nosso modo de vida nesse mundo acelerado muitas vezes acaba deixando-nos passar desapercebido os gênios que nos são contemporâneos. Steve Jobs transcendeu nossa época, foi um visionário da ciência e da engenharia, um homem de negócios e, ao mesmo tempo, um romântico – sonhador que deixou sua marca à posteridade. Resta o sentimento da perda.
Apesar de todos encantamentos e benefícios que a cultura traz em sua construção, temos que avaliá-la a partir dos seus múltiplos significados que lhes são possibilitados. É através dessa percepção que serão apontadas os desenvolvimentos elaborados pela mesma e de como suas reflexões favorecem, mas ao mesmo tempo desfavorecem na medida que quebra com os paradigmas da modernidade.
Naturalmente a sociedade aceita as novas invenções, sem ao menos compreende-la e questioná-la. Vivemos destituídos de compreensibilidades de nossa própria cultura, há quem o faça contrário, introduzindo novas concepções, articulando-as para desconstruir as instabilidades vivenciadas pelas ideologias implantadas na atualidade. É preciso e necessário atentarmos para essas rupturas de pensamentos, contornando as suas astúcias e fantasias, pois ilusões materializadas que trazem avanços as mesma na maioria das vezes nos distância, também do nosso próprio presente.
Não obstante, as transformações sociais, culturais e ideológicas dos tempos modernos inseriu cotidiano humano novas problématicas, desconfigurando as afetividades significativas da construção do homem com sua própria história.
É preciso transgredirmos com nosso próprio tempo para compormos suas criatividades e compactuá-las com suas múltiplas transcendências, tangenciadas não só para o imaginário social, mas também pela autonomia intelectual ao qual lhes são conferidas para o modelamento de sua aprendizagem do conhecimento humano.
Abraços professor.
Emanoel Cunha
Emanoel
Seu texto traz muitas observações importantes. Não podemos esquecer as muitas contradições que marcam a cultura, mas há pessoas que conseguem ir adiante com criatividade.
abs
antonio
Gleidson
Há perdas que trazem alertas. Jobs conseguiu superar impasses e transcender a mesmice. Merece respeito.
abs
antonio paulo
O mundo contemporâneo presenciou o surgimento de uma nova cultura. Diga-se de passagem, bastante efêmera com relação a seus avanços. O interessante é que como outros gênios e suas engenhosidades, esteve muito perto de resultar em nada. Deu certo um empreendimento iniciado dentro de uma garagem no subúrbio de São Francisco. A cultura tomou conta da tecnologia ou o contrário? Aos que a fazem, apresentam-se os desafios de torná-la acessível a uma quantidade maior de pessoas em todo o globo.
Filipe
Há sempre espaço para invenção. O que falta é ousadia e mais reflexão. Muito conformismo provoca apatia.
abs
antonio paulo
Steve Jobs tende a Lemniscata de nossa realidade por ter equilibrado conhecimento e ousadia possibilitando-o escrever sua própria historia. O questionamento de Seus grandes feitos não nos permitirá acréscimo considerável a nossa linha de conhecimento, pois, seus desempenhos nos proporcionaram grandes avanços e nos possibilitaram acesso a um mundo que dantes não era conhecido.
Acredito que teremos maior fundamento ao questionar o comportamento da sociedade diante o que lhes fora apresentado por Jobs. Temos consciência que vivemos em uma sociedade consumista e em grande parte encapais de questionar o que lhes é imposta, devemos Ascender além de nossa realidade e observar que paralelo a tudo o que nos é apresentado existe “o por que?” e a resposta deste implica em uma sociedade consente e livre de uma escravidão a qual chamo: submismo intelectual.
parabéns professor!
Caro amigo
Na história, existem figuras que desconsertam. Isso é bom. Renovam e trazem criatividade. Jobs trouxe boas energias.
abs
antonio