As portas do mundo, a ocupação da história

Entro e saio. Tropeço nos objetos e me vejo cercado de lixo por todos os lados. Será que era preciso inventar tanta coisa? Sempre me pergunto se há saídas. Ando pelas ruas e tenho impressão que os lugares são os mesmos. A especulação imobiliária propaga a mesmice. Engana. Muitos acreditam está próximos do paraíso. Tudo faz parte de uma encenação que compõe as histórias. Sócrates relatou a modéstia. Platão quis celebrar as ideias. Nietzsche derrubou valores. Benjamin foi um caçador de pérolas. Marcuse quis a revolução e o capitalismo segura a onda com estratégias especializadas. A vida passa, meu silêncio talvez esteja perto. Quem sabe? O calendário é magia.

O mundo tem portas. Não as vejo fechadas. A questão é a escolha. A multiplicidade nos confunde. Que histórias deveríamos construir com as possibilidades que aparecem? Há um debate constante, o consenso é uma raridade, o cinismo sobra. A dificuldade de conversar gera desconfianças. Seguimos o ritmo das máquinas. a escravidão das mensagens impensadas. Não há a preocupação de contemplar o rosto do outro. Sentimos estranhezas, anulamos crenças, jogamos fora conhecimentos. O desejo inquieto não deixa de sabotar as aventuras que pretendemos experimentar. Resta comer pipoca nos cinemas dos shoppings.

Saímos de atmosferas tensas. Respiramos. Esquecemos que não existe época sem crises. Os sonhos trazem um certo sossego, porém nada é para sempre. A dor de cabeça pode surgir, os incômodos das faltas de grana não desaparecem, o divã do psicanalista nos convida para um pequeno descanso. E as lembranças das infâncias ainda resistem? Hoje, tudo é filmado, a memória percorre outras dimensões. Aquela bola que jogamos mora nas vitrines das lojas com cores berrantes. Busca-se atrair, desenhar ilusões, balançar o cartão de crédito, atravessar encantos para esconder refugiados que perambulam sem sorte por territórios medonhos.

Nem por isso, a história se vai. Somos responsáveis. Se fugirmos, há abismos e vulcões que assombram. Temos que compreender a nossa incompletude e não cair em sistemas salvacionistas. O abraço é afeto, contudo preste atenção. Alguém diz que te ama só para provocar charme. É preciso cuidado, passear pelas ruas com os olhos abertos, saber que a história é uma obra coletiva e não se funda a vida na prisão de ídolos. Por que não escolher e assumir a escolha? Se existe mesmo o pecado original o coloque num envelope. Espere que o SEDEX  o envie para um canto do universo. Siga. As portas continuam abertas e não se deite na cola do berço esplêndido.

You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0 feed. You can leave a response, or trackback from your own site.

1 Comment »

 
  • Valerio Carvalho disse:

    É assim, falando na primeira pessoa, que desvelas melhor a tua alma.

    Além disso asseguras um ponto que faz convergir entre tu e nós uma
    passagem segura (não obstante teus mistérios absconsos) que em forma
    de ponte permite o trânsito dos sentimentos eivados de urgências –ou
    pacientemente ficam sob o resguardo do bem querer que inspiras aos teus.

 

Deixe uma resposta

XHTML: You can use these tags: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>